Não exatamente nessa ordem, mas as atividades entre 14 e 15 de outubro permitiram essas práticas e consequentes reflexões contidas no título. Voltando um pouco no tempo, entre 2013 e 2015 foram plantadas muitas árvores nativas e frutíferas exóticas para formar as 'agroflorestas'. Muito marcante pra mim foi que, só em 2015 conseguimos, equipe de trabalho da Outro Olhar e grupos nas Tekoa, entendermos mutuamente o que efetivamente era agrofloresta. A partir da expressão de um participante durante um curso 'ah, então agrofloresta é isso, fazer o que os antigos já faziam, agora que entendi'; o que era novo, não era novo, era revisitar uma prática antiga da Agricultura Guarani; e para nós os jurua, o entendimento de que não eram simples agroflorestas, eram Agroflorestas Guarani, significando que, na técnica da agrofloresta jurua se aplica a técnica e cosmologia Guarani.
Foto: Ara Ju |
Em 2021, essas agroflorestas estão nas Tekoa, em diferentes níveis, com diferentes cuidados. Novas variedades, replantios sendo feitos (com mudas nativas a partir da doação do Horto Faxinal do Céu - Copel) e uma deliciosa surpresa foi que, esse período é o período das cerejas estarem maduras. E para nossa alegria, três variedades de cereja nativa estão produzindo, sem recorrer aos nomes técnicos, vamos lá: cereja gordinha, cereja redondinha e cereja gordinha amarela. Lindo de ver, gostoso de comer. Alegria das crianças e dos adultos. Frutos do trabalho e dedicação de cada um que ajudou nessa construção.
Se em 2015 houve essa 'revelação', na sexta feira chuvosa do dia 15 de outubro, arrisco dizer que tivemos outra 'revelação/entendimento'. Há muito falamos em sementes crioulas, depois optamos por chamar de tradicionais ou sagradas; então nada mais justo que aproximar a agricultura Guarani da concepção dos Guardiões de Sementes. Tantas conversas, atividades e, novamente, o chegar ao entendimento do que o jurua quer dizer na sua língua e o que o Guarani entende na sua.
Foto: Ara Ju |
Parece tão simples 'Guardião de Sementes', pois, na concepção da expressão jurua talvez; na concepção Guarani havia uma grande diferença, quase um abismo que as palavras criavam. Tento explicar: o entendimento da palavra 'guardião' para o Guarani, não faz sentido para 'sementes'; guardar é um ato isolado, é um ato de 'retirar'; quase antagonizando com cuidado, reprodução. Então, quando se diz Guardião de Sementes, o que vem a mente é tão estranho que, por mais que a ideia fosse explicada já algumas vezes, ela não conseguia ser realizada.
E foi em uma conversa no entorno do fogo, que aquecia na manhã chuvosa, que o entendimento se fez, junto ao grupo Aty Miri da Tekoa Palmeirinha do Iguaçu. Para o Guarani sentido faz ser Nheminhoty Moĩ Porã, que é cuidar das plantas/sementes para que nunca acabem; não é guardar, é manter ela viva; garantir seus ciclos; garantir que a sagrada vida não se perca nela; manter saudável para que sempre possa germinar, de novo, de novo e de novo.
Então que as agroflorestas Guarani possam ser apoio aos Nheminhotỹ Moĩ Porã!
Por: Ara Ju (Sandra König)
Jurua - pessoa não indígena