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quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Nossas Culturas, Nossos Territórios, Nossa Luta Comum

Na tarde do dia 25 de setembro mulheres de territórios diferentes, de culturas diferentes se reuniram, presencial e online para uma 'Roda de Conversa'.

Mulheres organizadas em coletivos e também mulheres sem um coletivo específico que dedicam sua vida a trabalhar as causas sociais, a saber: Movimento Jera Rete, Grupo Aty Miri, Coletivo Feminista Cláudia da Silva, Movimento das Mulheres Camponesas e Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia- CAPA Núcleo Verê/FLD.


A poesia de Lunamar Cristina deu o tom do encontro:
Flores Guardiãs
sementes pequenas
sementes que somos
semente não é só feijão e milho
semente é da flor, da alface é de gente
semente é renda e é comida…
semente é uma missão que as mulheres
fazem de forma aguerrida
imagina o que seria da vida
se não fossem as flores
de várias cores
de muitos sabores
imagina o que seria da vida
se não fossem as hortas e os quintais
trazendo comida de verdade
pro campo e pra cidade
imagina o que seria da vida
se não fossem as matas
e os povos que nelas vivem
e toda sabedoria que eles transmitem
há quem, a vida cultiva
há quem ela cuide
há quem veja no viver
a motivação para cada dia
a vida saída da terra
do ventre
a vida saída de tantas mulheres
e de tantas sementes
Mulheres que criam vida
com seus corpos, suas mentes, seus espíritos
que sopram sonhos e canções
que reconhecem o canto dos pássaros
e o mudar das estações
Mulheres guardiãs
sabedoras de como manter
como melhorar
como semear
seus alimentos
Mulheres guardiãs
que conhecem espécies de flores
de ervas, de animais e de tudo que vai no roçado
Mulheres guardiãs
que cultivam na mata, sua comida
suas medicinas, sua ancestralidade

 

Foto: Ara Ju

Na dinâmica da Roda, foram partilhados os gostos, os medos e as alegrias. Para Sandra Ara Ju, mesmo sendo de territórios diferentes, cidade, campo, terra indígena sobressai o ser mulher, o cuidado; de formas diferentes; na cidade o cuidado voltado para o entender, estudar e contribuir para o avanço dos direitos das mulheres e para uma sociedade sustentável; no rural, o cuidado com as plantas, com os direitos, com a vida da família; na aldeia o cuidado com a família, com a comunidade, com as plantas, com a terra, com o viver da cultura.

Floriana Jaxuka diz que se emocionou em perceber que os medos que ela sente, são também os medos de outras mulheres; que sentiu que momentos assim fazem bem; que precisam ter outros. Como é bom ser compreendida e acolhida.

Rafaela, a princípio, chegou tímida, cheia de receios sobre o que compartilhar, timidez essa que logo se transformou em esperança, concretizada em cada palavra e em cada identificação que rolava com as mulheres indígenas e camponesas. Poder se reunir e falar entre mulheres, no meio das árvores, entre crianças brincando, entre os animais sobre sentimentos que não somos permitidas falar no dia a dia por conta das correrias, das atividades, das obrigações é uma forma de cuidado mútuo. Em cada palavra compartilhada era nítido o olhar da outra que por algum momento também se sentiu assim. Somos diversas e isso é maravilhoso!!! Que possamos celebrar a nossa diversidade, as nossas diferenças, que possamos viver nesse mundo possível onde a vida é mais importante que qualquer coisa!

Para mim, Eliane, foi um dia super diferente do "normal" um dia especial. A troca entre mulheres tão "diferentes" mostra que as diferenças quase não existem. Oque mais me marcou foi a questão dos medos e o que eles representam. Um medo que parece tão simples, como o medo do escuro, na verdade é muito mais que isso, na verdade é o maior medo, porque o escuro representa muito, representa tudo...

Foi um dia que guardarei em minhas memórias. Estar entre mulheres, compartilhar sentimentos nos fortalece muito.

Foto: Eliane Gralak

Talita diz que foi uma tarde inspiradora e cheia de emoções, que nos deixou com um gostinho de “quero mais”. Onde nossas diferenças e nossas semelhanças puderam se misturaram em um “compartilhar”. Ao final, combinamos um novo encontro, o qual me deixa empolgada por saber que podemos continuar nossas trocas e ainda podendo somar mais mulheres na roda.

Para Lunamar, camponesa integrante do MMC e assessora técnica do CAPA-Verê, esse momento foi de uma simplicidade e força que só se vê quando mulheres se unem, quando somos capazes de pôr nossa escuta e nossa fala às outras, com respeito de saber que cada história, cada vivência, trará suas dimensões da vida, cada mulher como uma árvore de raízes profundas, se junta com suas semelhantes na busca de manter se viva e triunfante numa sociedade que se esqueceu como é ser natureza. Mulheres de diferentes realidades, mas de sonhos comuns, de medos em comum e de risadas compartilhadas, mulheres que em uma tarde de sábado se juntam para saber que nunca estamos sozinhas quando temos umas às outras.

Para mim, Sandra Marli da Rocha Rodrigues do Movimento de Mulheres Camponesas – MMC, foi um momento de partilha, diálogo, escuta, solidariedade, sororidade e fortalecimento. Vivemos tempos muito difíceis, onde a diversidade de vida está ainda mais ameaçada, e para fazer o enfrentamento e resistência as políticas de morte que o sistema capitalista, patriarcal e racista nos impõe, precisamos nos fortalecer coletivamente, estreitando os laços entre as mulheres do campo, das águas, das florestas e das cidades. E, nesse sentido, a roda de conversa foi uma sementeira com terra fértil onde semeamos as sementes dessa articulação entre as mulheres de vários territórios desse chão paranaense!

Que possamos construir mais espaços para sentir/pensar/construir o esperançar por dias melhores!

Sigamos de mãos dadas fortalecendo a luta em defesa da vida, todos os dias.

E para o encerramento, Sandra Marli apresentou um texto, adaptado por ela de um grupo chamado "magias de bruxa”:

LIBERTO-ME, LIBERTE-SE, LIBERTEMO-NOS!

Eu liberto meus pais do sentimento de que já falharam comigo.

Eu liberto meus filhos e minha filhas da necessidade de trazerem orgulho para mim; que possam escrever seus próprios caminhos de acordo com seus corações, que sussurram o tempo todo em seus ouvidos.

Eu liberto meu parceiro/parceira   da obrigação de me completar. Sou completa, não me falta nada, aprendo com todos os seres o tempo todo. Estou em permanente construção.

Agradeço aos meus avós e antepassados que se reuniram para que hoje eu respire a vida.

Libero-os das falhas do passado e dos desejos que não cumpriram, conscientes de que fizeram o melhor que puderam para resolver suas situações dentro da consciência que tinham naquele momento histórico. Eu os honro, os amo e os reconheço inocentes.

Eu me desnudo diante de seus olhos, por isso eles sabem que eu não escondo nem devo nada além de ser fiel a mim mesmo e à minha própria existência, que caminhando com a sabedoria do coração, estou ciente de que cumpro o meu projeto de vida, livre de lealdades familiares invisíveis e visíveis que possam perturbar minha Paz e Felicidade, que são minhas responsabilidades.

Eu renuncio ao papel de salvadora, de ser aquela que une ou cumpre as expectativas dos outros.

Aprendendo através do AMOR e da minha experiência e existência no mundo, eu abençoo minha essência, minha maneira de expressar, mesmo que alguém possa não me entender.

Eu entendo a mim mesma, porque só eu vivi e experimentei minha história; porque me conheço, sei quem sou, o que eu sinto, o que eu faço e por que faço.

Me respeito e me aprovo. Respeitando a minha individualidade, me fortaleço na coletividade.

Eu honro a Divindade, a espiritualidade em mim e em você, eu honro as diversas expressões de divindades e religiosidades das mulheres do campo, das águas, das florestas, das periferias, do MMC… Somos livres! Sejamos livres!

 

Texto feito à muitas mãos: Eliane Gralak, Floriana Jaxuka Rete Poty Martines, Lunamar Cristina, Rafaela Contessotto, Sandra Marli da Rocha Rodrigues, Sandra König, Talita Slota Kutz

Foto: Eliane Gralak


Veja também:
http://coletivoclaudiadasilva.blogspot.com/

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