Semana do
empreendedorismo, os jornais e veículos de comunicação falam da capacidade
empreendedora do brasileiro, de que os pequenos empreendedores são importantes
para a economia, geram emprego, distribuem renda, etc. Isso é bom, certo?
Abrir uma
pequena empresa pra formalizar uma atividade que há tempo se faz de forma
informal, beneficiando mais de trinta famílias diretamente, é algo bom, certo?
Tudo
certinho, contrato feito, contrato assinado com assinaturas reconhecidas por
verdadeiro. Vai pra junta comercial, problemas: o papel não pode ser reciclato,
precisa ser branco. Se refaz o contrato, nova impressão, agora na folha branca
e assina de novo, simples. Mais ou menos, os sócios moram em municípios
diferentes, então recomendam que assinem e reconheçam por verdadeiro em cada
município.
Pega o
carro, faz 120 km, uma assinatura, no outro dia mais 88 km outra assinatura,
outro dia mais 380 km mais uma assinatura e por fim, mais 370 km e outra
assinatura, opa, é ponto facultativo o cartório está fechado, o que fazer?
Voltar, ou ligar e ver se o cartório da próxima cidade está aberto? Segunda
opção. Chegando ao cartório olhares peculiares, atendente some para uma sala,
volta, confirma: Onde o senhor mora? – Na aldeia. Olhar peculiar para o
contrato, para o sócio e: - não podemos reconhecer a assinatura. – Mas porque
não? – Simplesmente não podemos. – Pode dizer o motivo? Olhar peculiar e a
resposta: - Desconfio da autenticidade da identidade. – Como assim, qual o problema
com a identidade, pode dizer, pode me dar um protocolo dizendo o motivo? – Não
senhor, não tenho que explicar nada!
Na calçada,
sentimento de injustiça: não pode dizer! Certamente porque o motivo não é a
identidade, mais provável por ser um indígena fundando uma empresa! Desistir
então? Tudo acabado? Novamente voltar pra aldeia com a cabeça baixa porque ser
indígena é ser invisível, é não ter o direito de abrir uma ‘firma’! Ainda bem
que, apesar de tantos anos de opressão, se resiste.
Novamente a
estrada, mais 8 km, outro cartório, atendente avisado pelo colega! Exigindo o
motivo da negativa, conversa daqui, consulta a constituição, o decreto, o
estatuto, a surpresa: - Oh, índio tem direitos e é capaz! Então tá, podemos
reconhecer assinatura no contrato do empreendimento.
O que fazer
diante dessa falta de respeito? No momento, voltar à cidade e registrar um
boletim de ocorrência para tomar providências futuras. De volta à cidade,
procura a delegacia, fechada. Procuram-se os policiais, eles dizem que não
podem registrar o BO e dão a razão para o cartorário!! Demais! Volta-se para
outra cidade, com muita insistência se registra o BO e depois de longas horas,
enfim, dá pra voltar pra casa.
Agora é
preciso decidir o que fazer com o BO para que as pessoas, pelo menos as que
trabalham em órgãos oficiais não neguem direitos essenciais às pessoas!
Por: Antônio Carlos
Guedes e Sandra König
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